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Debate da CNI trouxe desafios da propriedade intelectual em meio a pandemia

Por Agência CNI de Notícias - Publicado 30 de outubro de 2020

Especialistas trouxeram possibilidades para combater a pirataria

A aceleração do processo de digitalização trazida pela pandemia trouxe novas perspectivas e desafios com o aumento do comércio eletrônico e a pressão pela inovação em áreas estratégicas como vacinas para combate ao coronavírus. É nesse contexto que ocorreram os debates do 4º Seminário de Propriedade Intelectual, realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) nesta quinta-feira (29). O evento foi correalizado pela Organização Mundial de Propriedade Intelectual (Ompi) e contou com o apoio do Instituo Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) e do Supremo Tribunal de Justiça (STJ).

Segundo o diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI, Carlos Abijaodi, são muitas as questões que ainda precisam ser discutidas para se promover a melhoria do sistema de propriedade intelectual frente aos novos desafios. “O seminário contribui para o aprofundamento de reflexões sobre a propriedade intelectual no Brasil e estimula, cada vez mais, o trabalho conjunto entre os setores público e privado promovendo a retomada do crescimento econômico e do desenvolvimento nacional”, destacou.

O diretor regional da Ompi, José Graça Aranha, elogiou o papel da CNI na modernização do sistema de propriedade intelectual no Brasil. Entre as conquistas enumeradas estão a adesão ao Protocolo de Madri, que permite ao país integrar o sistema internacional de registro de marcas, e o Programa de Combate ao Backlog de Patentes, que pretende reduzir em 80% o estoque de patentes sobre análise do INPI até 2021. “A China e a Coreia do Sul são exemplos de países que, em poucas décadas, conseguiram fortalecer suas economias e, entre as ações que contribuíram para isso, está a valorização do sistema de propriedade intelectual”, complementou.

Aumento de litígios sobre propriedade intelectual mostra amadurecimento do sistema

Na palestra magna, o ministro do STJ Paulo de Tarso Sanseverino disse que, apesar de o Brasil ter sido um país de vanguarda no Direito de Propriedade Intelectual – a primeira lei sobre o assunto é de 1830 –, o número de litígios sempre foi pouco significativo. No entanto, nos últimos dez anos, a situação se inverteu com aumento de mais de sete vezes de processos relacionados à propriedade intelectual no STJ. “Isso é positivo porque mostra um amadurecimento do próprio sistema e mais conhecimento da população”, comentou Sanseverino. “O desafio do Poder Judiciário agora é se familiarizar com casos pouco comuns que estamos vendo com essas transformações.”

Entre as principais preocupações do setor industrial no momento, está o crescimento da pirataria no comércio eletrônico. “Esse tema subiu no ranking de assuntos que mais preocupam a indústria brasileira”, assinalou o gerente-executivo de Política Industrial da CNI, João Emílio Gonçalves, que moderou o primeiro painel, sobre comércio ilegal.

A secretária nacional do Consumidor, Juliana Domingues, comentou que o Guia de Boas Práticas no Comércio Eletrônico, lançado em abril pelo Conselho Nacional de Combate à Pirataria, tem um papel importante no combate à pirataria e permite que tanto plataformas quanto consumidores se tornem mais ativos nessa guerra. “Sou cética quanto a soluções legislativas e entusiasta de instrumentos regulatórios, em especial a auto e a corregulação”, afirmou.

A opinião foi compartilhada por Paulo Batimarchi, Coordenador Regional de Internet para a América Latina do IFPI, que destacou a invialidade de se levar à Justiça todas as infrações sobre a propriedade intelectual que ocorrem no meio virtual. “A autorrregulação funciona muito bem nesse momento. Propor ajustes de leis sem conhecimento prévio da situação é desgastante e improdutivo”, disse.

Para a coordenadora-geral de Sementes e Mudas do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Virgínia Carpi, o maior risco de não se ter inovações de cultivares protegidas é não ter o retorno adequado para reinvestimentos em inovação e tecnologia. “Antes da entrada em vigor da Lei de Proteção de Cultivares, em 1997, somente instituições públicas investiam em inovação. Com essa garantia legal, cresceu muito a participação de investimentos privados no setor”, ressaltou.

Especialização e troca internacional de experiências marcam ação no Judiciário sobre propriedade intelectual

No segundo painel, mediado pelo ministro do STJ Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, o destaque das discussões foi o recente lançamento do Wipo Lex Judgments, banco de dados da Ompi que reúne decisões judiciais de diversos países. Atualmente dez nações integram a plataforma, entre elas o Brasil, e outras 30 manifestaram interesse. Ela aceita até cem sentenças por país, é gratuita e disponibiliza um tradutor automático. 

Segundo Eun Joo Min, diretora do Instituto Judicial da Ompi, apesar de ter sido criada a partir de pedidos de juízes da América Latina, a ferramenta beneficia tanto países desenvolvidos como em desenvolvimento. “As tecnologias evoluem rapidamente e o esforço legislativo nem sempre consegue acompanhar”, afirmou.

Ela destacou ainda a forte colaboração com o Ministério das Relações Exteriores para a entrada do Brasil no Wipo Lex Judgments. Dentro desse esforço inicial, o país incluiu na base de dados 36 sentenças judiciais, a maioria em direito autoral, segundo informou Heitor Figueiredo Sobral Torres, da Divisão de PI do Itamaraty. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está à frente do acordo. “Magistrados que queiram incorporar sentenças devem procurar o CNJ, que fará o trabalho de curadoria”, explicou Torres.

Para o desembargador Abel Gomes, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), o modelo deu certo. Tanto que se verificou um aumento das demandas judiciais na área de propriedade intelectual, tanto em número como em complexidade. “Há uma dificuldade de conjugar nossa formação jurídica com questões tão técnicas como as da propriedade industrial, sobretudo em relação aos julgamentos de patentes e de desenhos industriais. Mesmo em marcas, vemos que discussões como trade dress trazem aspectos de direito e de fato extremamente técnicos”, analisou.

Liliane Roriz, sócia do escritório de advocacia Licks Attorneys, tratou da “guerra de liminares” decorrente dos dois caminhos existentes para as ações de propriedade industrial – a Justiça Estadual recebe casos de infração a direitos de PI e a Justiça Federal, ações de nulidade desses direitos.

Propriedade Intelectual e Negócios

O terceiro painel foi dedicado à discussão sobre a relação entre a Propriedade Intelectual e os negócios, incluindo as políticas públicas que contemplam esta temática. Em sua apresentação, o coordenador-geral de Disseminação para a Inovação do INPI, Felipe Melo, destacou a relevância do programa INPI Negócios na estratégia atual do Instituto. Segundo ele, o objetivo deste programa é estimular a geração de ativos de Propriedade Intelectual no país e sua utilização como diferencial competitivo, inclusive por micro e pequenas empresas, bem como startups. "O programa INPI Negócios sintetiza um novo modo de atuação do INPI em escala nacional", afirmou Melo. 

Neste contexto, o coordenador-geral do INPI destacou a importância de parcerias estratégicas, incluindo o Sistema S, a Apex-Brasil (com foco na internacionalização de empresas nacionais) e a Embrapii. Melo também ressaltou que as atividades realizadas já apresentam resultados: no caso da carteira de empresas que atuam nas unidades Embrapii, já houve aumento de 15% no volume de ativos de PI gerados. 

Entre as atividades no âmbito do programa, destacam-se ações como a telementoria, que representa um atendimento mais próximo aos agentes envolvidos com inovação; a criação da Vitrine de PI, uma plataforma eletrônica para expor tecnologias que possam ser negociadas ou licenciadas; e as rodadas de negócios desenvolvidas a partir de acordo com a Dinamarca. 

Encomendas tecnológicas

O secretário especial adjunto de Emprego, Produtividade e Competitividade do Ministério da Economia, Bruno Portela, mostrou as ações do governo para viabilizar a compra, de maneira ágil, de uma futura vacina para a Covid-19. A saída encontrada foi estabelecer um contrato de encomenda tecnológica entre a Universidade de Oxford, a farmacêutica Astrazeneca e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Trata-se de uma compra pública do desenvolvimento da tecnologia, que assume os riscos envolvidos e determina a transferência de tecnologia para a instituição brasileira no final. “Não compramos vacinas, compramos esforço de P&D (pesquisa e desenvolvimento). Isso que é encomenda tecnológica”, explicou Portela.

Segundo o secretário, o Brasil pagará US$ 3,50 por dose da vacina, o menor valor no mundo. A previsão é que 15 milhões de doses sejam fabricadas em dezembro deste ano e mais 15 milhões em janeiro de 2021, que serão distribuídas após a aprovação do registro pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Em sua apresentação, Portela ainda destacou o esforço da indústria para manter o abastecimento durante a pandemia de Covid-19 e comentou que o Marco Legal das Startups, após importante apoio da CNI para sua elaboração, foi enviado para o Congresso Nacional na semana passada. 

Desafios do sistema de propriedade intelectual com as novas tecnologias

Como em todas as áreas, as novas tecnologias estão mexendo com as estruturas do sistema de propriedade intelectual. Fabiano Barreto, especialista em Política e Indústria da CNI, que moderou o último painel, afirmou que a instituição está produzindo um estudo sobre os desafios que novas tecnologias impõem sobre a propriedade intelectual, como a discussão sobre a quem pertencem as invenções geradas por inteligência artificial. "Oferecer proteção, direitos de exclusividade, para invenções criadas por ferramentas de inteligência artificial pode contribuir como incentivo para o desenvolvimento de novas tecnologias."

De acordo com Daly Alica, representante da Ompi, o sistema de propriedade intelectual sempre teve de se ajustar a novas tecnologias e a tendências, como bioteconologia há alguns anos. “Hoje a inteligência artificial é o novo desafio. O momento agora não é buscar respostas para perguntas específicas, mas conscientizar pessoas sobre possibilidades que podem ocorrer”, destacou.

Entre as polêmicas trazidas pelo novo cenário está a questão dos dados pessoais como passíveis de proteção. Segundo Rodrigo Leme, da Adobe, essa interface de dados pessoais com propriedade intelectual não é intuitiva, mas é possível crescer essa interação. “Os dados poderão ser protegidos com código, assim como no modelo de bitcoin, que trabalha com a chamada escassez digital, em que não existe pirataria”, sugeriu.

No caso da Microsoft, há um programa de nove princípios para a segurança cibernética, entre os quais estão proteção de propriedade intelectual e evitar ataques a processos eleitorais em países democráticos. Cerca de mil stakeholders da empresa, como empresas e academia, estão engajados com os princípios. “É uma iniciativa sem custo e sem compromisso formal, mas é importante para todos se unirem em torno disso para ter uma internet mais segura e, com isso, ter o desenvolvimento e a transformações digital que todo mundo precisa”, disse Márcio Gonçalves, diretor de Assuntos Corporativos da Microsoft.

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