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Eixo de desenvolvimento do país, indústria enfrenta desafios para superar crise

Por Agência CNI de Notícias - Publicado 18 de novembro de 2019

A 1ª reportagem mostra que o setor é responsável por um quinto do PIB

Em 2010, o PIB do setor industrial brasileiro cresceu impressionantes 10,2%, valor recorde para a série do IBGE iniciada em 1996. O ano anterior foi marcado pelos desdobramentos da crise financeira internacional iniciada em 2008, então a base comparativa não era das melhores, mas o aquecimento do mercado interno parecia indicar que a indústria do país passaria por uma nova fase de expansão e fortalecimento.

Mas o boom não se concretizou e a alta no PIB industrial teve o sinal invertido já em 2012 (-0,7%). A partir daí, novas retrações foram registradas em 2014 (-1,5%), 2015 (-5,8%), 2016 (-4,6%) e 2017 (-0,5%).

Para perscrutar os caminhos que a indústria pode percorrer para superar os anos de contração e retomar o fôlego de um setor que ajudou a dar cara ao Brasil, o site Poder360 inicia uma série de reportagens especiais. O trabalho jornalístico tem o apoio da Confederação Nacional da Indústria (CNI). A série Caminhos da Indústria – desafios e oportunidades terá 16 textos publicados semanalmente e reunidos em uma página especial.

HISTÓRICO - O setor industrial começou a se desenvolver ainda no século 16, de forma tímida e incipiente. Passou por um desenvolvimento lento nos séculos seguintes até atingir o vigor que ajudou a modelar a sociedade urbana brasileira no século 20, especialmente a partir de 1930 com as grandes indústrias nacionais: Petrobras, Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e Companhia Vale do Rio Doce, entre outras.

INDÚSTRIA HOJE - Mesmo com as dificuldades proporcionadas pela recessão e lenta recuperação econômica do Brasil nos últimos anos, o setor industrial ainda é um dos principais eixos de desenvolvimento do país.

A indústria corresponde a 21,6% do PIB brasileiro e emprega 20,3% dos trabalhadores formais do Brasil – são 9,4 milhões de pessoas com carteira assinada. Os trabalhadores da indústria ainda recebem salário superior à média do país. No caso de indivíduos com ensino superior, empregados da indústria recebem em média R$ 7.734 contra R$ 5.676 da média nacional.

Para cada real aplicado na indústria resulta em aumento de R$2,40 na economia do país – ante resultado de R$1,66 da agropecuária e valor que varia entre R$1,45 e R$1,93 de serviços. Os dados são da CNI e do IBGE.

DESAFIOS - Depois dos anos de recessão, a economia brasileira se recupera lentamente e a indústria segue passo parecido. Em 2018, o setor registrou resultado positivo de 0,6%. Em 2019, a expansão deve ser um pouco maior, mas limitada por instabilidades internas e no mercado global, a indústria deve terminar 2019 com crescimento inferior a 1%.

Na avaliação do presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, um círculo não virtuoso que impede a retomada do crescimento sustentado e a indústria é uma das saídas para o país retomar o crescimento sustentado:

“Se olharmos os países desenvolvidos, países que conseguem distribuir a riqueza entre a população e desenvolver tecnologia, são os países que têm uma indústria forte: Alemanha, Estados Unidos, China, Japão, Coreia do Sul. Há poucos anos, o ministro da Economia da Alemanha me disse que, em 2001, a Alemanha tinha tomado a decisão de investir na indústria alemã, ao invés de investir em outras áreas da economia. E que essa estratégia deu certo. Essa conversa foi em 2014 ou em 2015 e, até aquela data, a Alemanha era um país forte, talvez o país mais forte da Europa, com mais capacidade financeira. Isso prova a importância da indústria para um país”, explica Robson Andrade. 

OBSTÁCULOS - Para o presidente da CNI, a desproporção da carga tributária que incide sobre a cadeia produtiva é um dos maiores desafios do setor industrial. Em 2018, a indústria foi responsável por 21,6% do PIB do país, mas a carga tributária fez com que bancasse 34,2% dos tributos federais arrecadados em 2018. “É preciso que haja uma melhor distribuição dessa carga tributária. Quase 1/3 da carga tributária do Brasil é custeado pela indústria. Isso não pode, temos que ter uma melhor distribuição dos impostos entre os setores da economia”, defende o presidente da CNI. Andrade destaca também que essa assimetria é um dos fatores que elevam o custo de se produzir no país, espantando investimentos.

O tema estará nas propostas de reforma tributária que tramitam no Congresso Nacional e devem ser discutidas em 2020. Para a CNI, o projeto precisa atacar a complexidade do atual sistema tributário. “Temos 27 legislações estaduais para ICMS. Um primeiro ponto da reforma tributária seria essa simplificação, porque hoje gasta-se muito apenas para calcular os impostos” – e os elevados custos para contratação e para demissão de mão de obra.

“É essencial que haja uma redução do custo do trabalho, que tem que ser discutida e negociada. Tirar imposto da produção e colocar no consumo, como é nos principais países do mundo”, defende o presidente da CNI.

Economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), Renata de Mello Franco lembra que o setor industrial foi o último a sair da recessão técnica que o país atravessou em 2015 e 2016 e que tem enfrentado dificuldades que extrapolam o desaquecimento da economia brasileira. “A indústria extrativa teve uma dinâmica diferente de saída da crise, marcada pelas tragédias de Mariana e de Brumadinho. Já a indústria de transformação estava com um desempenho bom em 2018 até a greve dos caminhoneiros. A greve aumentou a incerteza política e acabou prejudicando a atividade industrial”, avalia a especialista. 

A crise na Argentina, importante parceiro comercial do Brasil, e a guerra comercial entre Estados Unidos e China aumentaram os riscos no cenário global, o que se traduz em retração dos investimentos e do consumo. “A indústria automotiva tem sido uma das mais afetadas pela crise argentina. Isso preocupa porque é um segmento que possui cadeia produtiva longa, que usa produtos feitos por outras indústrias, como itens plásticos e metalúrgicos”, destaca Renata.

Já os efeitos que os choques entre as duas maiores economias do mundo podem ter no mercado brasileiro são incertos: “Por um lado, o Brasil pode tentar ganhar espaço no mercado norte americano, substituindo itens chineses. Por outro, pode ser que a China tente entrar no mercado brasileiro de forma mais agressiva”, diz ela. 

Buscando superar as dificuldades, a indústria aposta em pesquisa e inovação. Dados compilados pela CNI mostram que o setor responde por mais de 67% dos investimentos empresariais feitos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) e levantamento feito neste ano com CEOs de 100 indústrias – 40 de grande porte e 60 pequenas e médias – revelou que 31% deles acreditam que a inovação é fundamental para garantir a sustentabilidade dos negócios.

“A indústria é um setor que desenvolve tecnologia, que gera inteligência, que dissemina pesquisas e inovações e que dá competitividade para outros setores da economia. A nossa agricultura é muito competente, mas ela depende basicamente dos equipamentos, das máquinas, dos computadores, das previsões de tempo feitas por satélites, dos insumos, adubos e produtos químicos, sementes. Tudo isso é produzido pela indústria”, pontua o presidente da CNI.

No cotidiano, as pessoas raramente se dão conta de como a indústria está presente em todos os momentos: do cafezinho de toda manhã aos olhos que não desgrudam da tela do celular, tudo passou pelo setor.

Um exemplo de indústria que permeia praticamente todas as atividades do cotidiano é a química: alimentos, embalagens, construção civil, vestuário, meios de transporte, saúde.

Criada em 2002, a petroquímica Braskem é a maior empresa do segmento na América Latina e possui atualmente 40 unidades industriais –com instalações inclusive na Alemanha, nos Estados Unidos e no México. Para quem mora no Brasil, é difícil passar um dia sem entrar em contato com as resinas produzidas pela empresa. “Nossos produtos estão presentes em diversos segmentos como embalagens alimentícias, construção civil, industrial, varejo, automotivo, agronegócio, saúde e higiene, entre outros”, detalha Edison Terra, vice-presidente de Olefinas e Poliolefinas da Braskem na América do Sul.

Os produtos químicos e petroquímicos desenvolvidos pela Braskem são matéria-prima para outras empresas, principalmente da indústria de transformação. Em setembro, a Colormaq – fabricante de eletrodomésticos de linha branca– inovou ao lançar máquinas de lavar com componentes feitos com plástico desenvolvido a partir da cana-de açúcar. A planta também tem sido utilizada pela Braskem para produzir resinas que são utilizadas na fabricação de calçados, brinquedos e até de solventes. “Lançamos em julho o primeiro solvente de fonte renovável, para aplicações nos segmentos de tintas, tíneres e adesivos”, complementa Terra.

A produção anual da Braskem chega a 8,9 milhões de toneladas de resinas termoplásticas, mas a empresa integra um dos segmentos produtivos mais afetados pelo desaquecimento da economia brasileira.

Professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (Eaesp-FGV), o economista Nelson Marconi afirma que a indústria química perdeu força durante a recessão que o país atravessou na metade desta década, perdendo espaço para produtos importados.

“Várias empresas fecharam suas fábricas aqui e levaram plantas para o exterior. Investir no setor agropecuário é importante, mas, do ponto de vista tecnológico, não vai nos colocar na ponta do que interessa da cadeia produtiva do comércio internacional. Precisamos fortalecer setores com maior desenvolvimento tecnológico, com maior valor adicionado. A indústria química é fundamental, porque produz insumos para várias outras indústrias”, finaliza o economista. 

A série Caminhos da Indústria – desafios e oportunidades é produzida pelo Poder360, com apoio da CNI.

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