“A neoindustrialização verde pode mudar, para melhor, o futuro do Brasil”. Com essa frase, o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, deu o pontapé inicial do evento Powershoring e a Neoindustrialização verde do Brasil – Perspectivas, Potencial, Políticas Públicas e Privadas, que debateu, nesta terça-feira (15), o potencial da descentralização de cadeias produtivas globais para países próximos a centros de consumo e que oferecem energia limpa, segura, barata e abundante.
A conferência foi realizada em Brasília pela CNI, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Banco do Nordeste (BNB) e o Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CAF).
“O evento de hoje é mais uma contribuição da Confederação Nacional da Indústria para a construção de uma agenda estratégica para o país, que considere o imperativo da descarbonização da economia e as vantagens geográficas e geopolíticas do Brasil”, disse Robson de Andrade.
O presidente da CNI lembrou que hoje, cada R$ 1 produzido pela indústria brasileira fomenta R$ 2,44 na economia como um todo.
Esse números podem ser alavancados, caso o país aproveite as janelas de oportunidades do desenvolvimento verde. Como exemplo do potencial brasileiro nessa agenda, o CAF anunciou o repasse de até US$ 600 milhões para BNDES e BNB, para linhas de crédito voltadas a plantas industriais de energia renovável.
Representando o MDIC, o presidente da República em exercício, Geraldo Alckmin, reforçou os atrativos do país.
“A pergunta sempre foi: onde é que eu fabrico bem e barato? Agora, é: onde eu fabrico bem barato e consigo compensar as emissões de carbono? E aí o Brasil é a grande alternativa. Nós vamos ter uma grande oportunidade. Nós já somos o quinto país do mundo em atração de investimento”, disse.
Ao longo de quatro painéis, representantes do governo federal, das instituições responsáveis pelo evento e do setor privado dividiram suas experiências e apontaram formas de o Brasil despontar.
Veja abaixo os temas e debatedores de cada painel e acompanhe a cobertura na agência de notícias da indústria.
Gordon: O Brasil pode atrair um fluxo grande de investimento com sua matriz energética e capacidade de desenvolver tecnologias verdes, mas não podemos apenas receber os investimentos, temos que saber como agregar valor à economia e como a indústria se incorpora nessa cadeia. Queremos atrair as indústrias, queremos que usem nossa matriz energética, mas que também aproveitem para desenvolver tecnologias aqui, tragam seus centros de pesquisa e utilizem a cadeia produtiva brasileira, que é muito forte.
Arbache: Se tem algo que vai definitivamente guiar os investimentos no Brasil é a agenda de sustentabilidade, e esses investimentos terão que ser feitos com parcerias internacionais. O país não tem recursos necessários para acelerar e realizar todo esse gigantesco potencial que temos para participar da agenda de manufatura verde.
Esteves: Quando falamos de powershoring estamos falando de segmentos que têm mais emergência, ou seja, demanda de energia no processo produtivo, com uma emergência de migrar para a energia verde. E aí, o powershoring é uma possibilidade para gerar renda e desenvolver cadeia de valor.
Rollemberg: Nós somos privilegiados, estamos vivendo um momento histórico para o país, nenhum país hoje tem o que o Brasil tem. Temos que aproveitar todas as oportunidades que o powershoring nos oferece, esse é um tema que unifica o país. A prioridade nesse momento é aprovar regulamentações como as eólicas offshore e o hidrogênio.
Lucchesi: A grande vocação do Brasil é o powershoring, é focar na energia verde. O Brasil não pode apenas pensar em nova commodity a partir da energia verde, mas pensar sobretudo como isso pode ser um elemento impulsionador no desenvolvimento industrial. Essa é uma agenda extremamente importante para a qual a indústria brasileira está pronta e ativa.
Carina: O governo brasileiro, liderado pelo Ministério da Fazenda, não vê o combate à emergência da mudança do clima como um custo para país, como um custo social, mas sim como uma oportunidade de alavancar a economia brasileira, de reindustrializar o país. O plano de transformação ecológica é primeiro de tudo um plano de transição para uma economia de baixo carbônico sim, mas não só. Como eu disse, a gente vê transformação ecológica pela lente de uma oportunidade que o Brasil pode viver nos próximos anos de industrializar o país.
Elbia: O Brasil, aparentemente, é um país competitivo para a produção de energias renováveis. O Brasil é um dos países mais ricos do mundo em recursos renováveis, mas hoje o Brasil está muito mais na vantagem comparativa do que efetivamente na vantagem competitiva. Nós precisamos ajustar todo o nosso processo industrial, todas as nossas políticas para, de fato, sermos competitivo.
Sauaia: A nossa recomendação é que, aproveitando esse grande programa [projeto do governo federal citado pela Carina Vitral] que está sendo desenvolvido tanto na área de transição energética quanto de transformação ecológica, a gente coloque uma meta para 2026: 5 milhões de telhados fotovoltaicos. Já temos 2 milhões.
Mônica: Pelos olhos do hidrogênio, quais são as regiões que que oferecem vantagens competitivas para receber investimentos nesse setor? Então, primeiro é o grande potencial de energias renováveis e as inúmeras fontes de energias renováveis existentes no nosso país. Segundo lugar, o preço competitivo de energia renovável. Na transição energética, país que tem potencial de energia renovável é o país rico. Então, vai existir uma mudança geopolítica no mundo [...] O país que tem um preço de energia renovável a 25 dólares o kW já promove a competitividade com aqueles que utilizam insumos fósseis. O Brasil está bem perto disso. No mercado livre, estamos na faixa dos 30, 35 dólares. É preciso baixar.
Natalia: Tão importante quanto pensarmos em onde vamos aplicar os recursos é como vamos canalizar as fontes alternativas. E um pouco do painel que quisemos trazer é que não só sobre como diversificamos essas fontes e aproveitamos os recursos, mas como podemos ter o olhar para ampliar a profundidade do mercado local de capitais que nos ajude nessa transição.
Dos Santos: O investidor institucional internacional olha alguns elementos na hora de alocar os seus recursos, criar e buscar novos portfólios. A agenda de hoje tem vários atributos que podem contribuir para atração desses recursos, atraindo novas plantas, novas instalações de fábricas para tocar produtos verdes aqui no Brasil.
Fox-Drummond: O acordo entre o Mercosul e a União Europeia é fundamental para a questão de neoindustrialização verde e powershoring porque os envolvidos são países muito ligados a esse assunto, então existem sinergias naturais que podem facilitar muito esse adensamento de cadeias produtivas.
Liane: O modelo de investimento misto (blended finance) surge como uma estratégia de financiamento da transição verde justa. Estamos falando de uma estratégia que resulta em soluções financeiras que realmente podem suportar esse período de transição, mas que tem que desembocar na economia verde justa. Então, também é um elemento extremamente estruturante.
Mosquera: O pacote verde do ministro [Fernando] Haddad é um ótimo exemplo de como a gente pode acelerar essa transição. Agora, tem outros temas que a gente precisa ajustar. A gente está falando de produtividade da indústria e ela só vem com ferramentas de digitalização, a gente precisa garantir a educação digital para os nossos trabalhadores, trazer as pequenas e médias empresas [para dentro das ferramentas tecnologias e a gente precisa garantir um arcabouço regulatório em segurança cibernética que garanta a proteção dos dados.
Sattamini: Para que tenhamos sucesso no powershoring, precisamos de um elemento fundamental: saúde do setor elétrico e que o setor elétrico seja dinâmico. E, para isso, o ambiente de negócio, a regulação, as políticas setoriais têm que estar avaliadas e alinhadas com o interesse do país e com a melhor alocação possível de recursos que nós temos.
Viga: A gente precisa de pressa agora porque Estados Unidos e Europa já colocaram metas concretas. E o investidor precisa de previsibilidade. Então, quanto mais rápido colocar previsibilidade, metas e desonerar essa indústria, que precisa diminuir o risco do primeiro entrante, mais a gente vai ter projetos vindo para o Brasil. Esse é um dinheiro que não tem pátria, são trilhões rodando, procurando um lugar para pousar. Se a gente fizer muito rápido, com ajustes muito cirúrgicos, a gente consegue trazer esse investimento, que aí traz emprego, renda e inclusão social.
Bomtempo: Queria elencar dois pontos. Primeiro é em relação à comunicação e vai ao encontro com este evento. Acho importante uma comunicação adequada dessa agenda, enaltecendo essas vantagens comparativas e competitivas do Brasil tanto aqui em ambiente doméstico, quanto lá fora. E o segundo ponto que queria ressaltar é a necessidade de como receber essa nova economia. A gente vai precisar de pessoal treinado e capacitado, e com certeza o Senai está bem-posicionado nessa agenda.
É preciso ampliar investimento em inovação, diz Nobre
No encerramento da conferência, o pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP, diretor do Instituto de Estudos Climáticos da UFES e diretor da Amazon Third Way Initiative/Projeto Amazônia 4.0, Carlos Nobre, ressaltou a importância do debate de powershoring e neoindustrialização verde e destacou, entre outros fatores, a necessidade de enfrentar desafios como o do baixo investimento em inovação tecnológica.
“É importante que setores público e privado se juntem numa parceria público-privada para que o Brasil vença esse desafio. Não podemos continuar sendo um país que investe tão pouco em inovação tecnológica. Os setores precisam investir muito para caminhar na direção dessa discussão feita aqui hoje”, disse o pesquisador.