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Recuperação econômica depende da vacinação

Por Agência CNI de Notícias - Publicado 25 de fevereiro de 2021

Silvia Matos, do Ibre-FGV, espera um ano de crescimento econômico

A economia brasileira deve registrar uma leve retração no primeiro trimestre. Entretanto, com o avanço da vacinação, a recuperação da atividade econômica deve se acelerar e o Produto Interno Bruto (PIB) pode fechar 2021 com um crescimento de 3,5%, avalia Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV) no Rio de Janeiro.

Segundo ela, será necessário, também, “muito alinhamento para vencer as resistências e convencer a sociedade” sobre a necessidade de aprovar uma reforma tributária. “Os grupos de interesse que vão perder, no caso da reforma tributária o (setor) de serviços, sempre vão ser contra. A agenda de reformas precisa desse convencimento e os líderes precisam estar unidos”, alerta a especialista.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Quais foram os principais impactos da pandemia sobre o setor produtivo em 2020?

SILVIA MATOS - Foi um ano atípico para qualquer país e, sem dúvidas, ainda mais desafiador para o Brasil. Aqui, a pandemia ocorreu em um momento ainda de muitas fragilidades. Essa é uma questão importante. O Brasil tinha passado por uma recessão muito dura, que iniciou em 2014 e durou até 2016, mas foi uma saída atípica, de baixo crescimento. Algo muito estranho aconteceu na economia brasileira. É natural ter um crescimento rápido ao sair da recessão, mas o que ocorreu foram anos de baixo crescimento e produtividade, com o mercado de trabalho ruim e de informalidade, além de desafios fiscais.

Então veio a pandemia, que exige muito do setor público. Diferentemente de uma crise financeira, na qual você faz políticas monetárias e consegue recuperar, é necessária a transferência de renda. Nesse aspecto, o Brasil teve um choque atenuado por investir fortemente em políticas fiscais, similar aos países ricos, tanto que o resultado do PIB no segundo trimestre foi uma queda menor do que a registrada em outros países. Tivemos uma queda menor por gastar mais. Naturalmente, depois de o Brasil fazer políticas fiscais fortes, veio a recuperação.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - E na indústria de forma geral?

SILVIA MATOS - Com protocolos rígidos, foi possível conviver com a pandemia. A indústria sofreu no início pelo lockdown severo e as cadeias de produção pararam, mas com a normalização das cadeias, a indústria pode funcionar com a pandemia. É difícil de entender, mas é interessante do ponto de vista da organização produtiva. Outro fato é que as pessoas receberam renda e não puderam consumir serviços, então a poupança aumentou e a renda foi para o consumo de bens. Alguns setores da indústria foram muito favorecidos, como bens não duráveis e bens farmacêuticos, relacionados à saúde. A indústria de bens também demanda um intermediário produzido pela própria indústria, então criou-se esse ciclo virtuoso. Isso é um padrão dos países e isso é muito bom. Nem todos os setores se beneficiam tão rapidamente.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Quais são as perspectivas para 2021?

SILVIA MATOS - É um desafio grande. Poderíamos imaginar uma recuperação muito rápida com a vacinação. Muitos países já estão em ritmo rápido de vacinação. Começamos 2021 com uma onda mais forte de novos casos da doença. Caso tivéssemos a vacinação acontecendo muito rápido, poderíamos ter perspectivas melhores. Os Estados Unidos vão crescer muito esse ano, porque têm espaço para crescer com políticas expansionistas e fiscais. O Brasil não, porque gastamos muito no ano passado e não temos orçamento. Temos que criar esse espaço para poder estender benefícios.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - E a questão fiscal?

SILVIA MATOS - De um lado, a economia pede mais benefícios — porque é uma demanda legítima, uma vez que ainda temos fragilidades —; do outro, o fiscal, ainda não há equilíbrio. Não só não nos preparamos para uma vacinação em massa como também não discutimos sobre o orçamento para eventual extensão dos benefícios. Criam-se duas incertezas: como vamos vacinar e como vamos discutir mais auxílio e sustentabilidade fiscal? A palavra é incerteza e incerteza é algo péssimo para a recuperação econômica. Com isso, o início de ano vai ser muito desafiador.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - O que podemos esperar para o PIB?

SILVIA MATOS - Acreditamos que o PIB do primeiro trimestre vai contrair pouco, em torno de 0,5%. À medida que avançarmos e conseguirmos superar a questão da vacinação, vamos recuperar bastante no segundo semestre. Acho que é possível crescer em torno de 3,5% neste ano, mas é um ano muito desbalanceado. Um primeiro semestre muito ruim e o segundo muito bom. Depois da vacina, vamos ver a retomada, com pessoas consumindo serviços e emprego e renda voltando.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Que outras medidas poderiam ser aprovadas para melhorar o ambiente de negócios?

SILVIA MATOS - Uma discussão que permeia a pandemia é o controle dos gastos obrigatórios. A PEC do teto é muito importante, mas sozinha é uma muleta, um atalho para conseguir sustentabilidade. Não se sustenta a longo prazo porque é preciso reduzir os gastos obrigatórios. Nós conseguimos reduzir os gastos da Previdência, mas essa é a primeira etapa. Quais são os outros gastos obrigatórios? Primeiro: funcionalismo público. Nós temos espaço para redução de gastos com funcionários públicos e com políticas que entram nos gastos chamados de tributários.

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