Como parte das ações para acelerar a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) nos próximos anos, a União Europeia criou o Mecanismo de Ajuste de Carbono na Fronteira (CBAM, em inglês), uma sobretaxa aplicada sobre as emissões de produtos importados pelos países do bloco.
Funciona assim: na fase transitória, iniciada em outubro de 2023, os importadores deverão submeter às autoritades europeias relatórios trimestrais com informações sobre os produtos importados e as emissões incorporadas. Já na fase regular, a partir de 2026, os importadores deverão comprar certificados CBAM que representam o montante das emissões de gases de efeito estufa medidas em CO2 equivalente (CO2e) incorporadas em determinados produtos importados. Cada certificado equivale a uma tonelada de emissões de CO2. O mecanismo irá afetar apenas alguns setores e o cálculo varia para cada um.
Para auxiliar os exportadores brasileiros com parceiros comerciais do bloco e minimizar os impactos da medida, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) produziu um manual sobre o regulamento. O documento tem tudo o que as empresas do Brasil precisam saber para se adaptarem às novas regras na fase transitória do CBAM.
Uma análise da CNI aponta que o CBAM impactaria mais de US$ 3 bilhões das exportações brasileiras dos produtos afetados pelo mecanismo para a UE em 2023. Praticamente todas essas exportações seriam concentradas no setor de ferro e aço, conforme avaliação da CNI, baseada em dados do ComexStat.
Confira aqui um perguntas e respostas para entender melhor como funciona o CBAM:
1. O que é o CBAM?
O CBAM é o instrumento da União Europeia para aplicar um preço ao carbono emitido na produção de bens importados pelo bloco. O mecanismo de ajuste de carbono foi criado pelo Regulamento 2023/956, publicado em maio de 2023 pela UE. Para que a medida seja totalmente implementada, ainda serão decretados os atos regulatórios.
2. Qual o objetivo do mecanismo?
O CBAM foi criado para controlar as importações de produtos com grande emissão de carbono e evitar o vazamento – transferência da produção e das emissões de uma empresa para fora da Europa – em regiões com regras menos exigentes de descarbonização, o que prejudicaria o alcance da meta climática do bloco europeu, de alcançar a neutralidade climática até 2050.
3. Quais produtos serão submetidos ao CBAM?
Inicialmente, a medida será aplicadoa às importações de produtos com quantidade significativa de carbono e mais sujeitos ao vazamento de carbono. Esses itens fazem parte dos setores de ferro e aço, alumínio, químicos (basicamente hidrogênio), cimento, fertilizantes e eletricidade.
4. Como funciona o regulamento?
O CBAM está em vigor desde maio de 2023 e em fase transitória desde outubro. Nesta primeira fase, os importadores europeus devem consolidar os dados das emissões embutidas nos produtos sujeitos ao CBAM que compram de fora dos países do bloco. Essas informações têm de constar em um relatório trimestral que os europeus devem apresentar às autoridades responsáveis. O primeiro relatório, referente aos meses de outubro, novembro e dezembro deve ser entregue às autoridades europeias até o dia 29 de fevereiro.
Além dos relatórios, os importadores que desejam continuar com essas operações de comércio terão de se tornar declarantes CBAM autorizados a partir de 31 de dezembro de 2024. A medida é necessária porque a partir 1º de janeiro de 2026 – a fase regular – apenas os importadores com esse título poderão importar produtos sujeitos ao CBAM na União Europeia.
Na fase regular, a UE passará a cobrar pelas emissões de GEE em importações intensivas em energia. Os importadores europeus terão de declarar anualmente a quantidade de bens que entraram no bloco e os gases de efeito estufa incorporados no ano anterior.
A partir daí, passam a valer os certificados eletrônicos CBAM, que representam as emissões de carbono embutidas no produto importado para a União Europeia. Cada certificado equivale a uma tonelada de emissões de CO2. Os importadores europeus terão de comprar esses certificados de acordo com as emissões de cada bem que adquirem de fora.
5. O que deve constar nos relatórios trimestrais da fase transitória?
- Informações gerais sobre período de importação e sobre o importador, o declarante, os produtos, as plantas de produção e outros dados;
- Quantidade total de cada produto importado em tonelada e especificado por planta de produção no país de origem;
- Emissões diretas e indiretas incorporadas por unidade de produto, calculadas segundo a metodologia prevista no regulamento de implementação;
- Se for o caso, o preço de carbono do país de origem, incluindo descontos e outras formas de compensação.
6. O que são emissões incorporadas, diretas e indiretas?
Emissões incorporadas são levadas em conta para contabilizar o número de certificados CBAM a serem entregues para aquele processo produtivo. O cálculo será de acordo com uma fórmula estabelecida pela União Europeia ou por meio de um valor-padrão. As emissões diretas são resultado do processo de produção do produto, enquanto as indiretas estão relacionadas ao consumo de eletricidade na produção dos bens sujeitos ao CBAM.
7. Como será fiscalizado o cumprimento do CBAM?
A Comissão Europeia, órgão executivo da União Europeia, fará a supervisão do regulamento e o acompanhamento do Comitê CBAM, que ainda será criado. Cada país deverá indicar uma autoridade competente para garantir a aplicação do mecanismo no seu território e trocar informações com as demais autoridades e com a Comissão Europeia.
8. Há exceção ou isenção para a cobrança e qual a relação com o mercado de carbono?
O Regulamento CBAM prevê isenção do imposto para países e territórios fora da União Europeia que já tenham mecanismo similar ao Sistema de Comércio de Emissões da União Europeia (em inglês, EU ETS). A Comissão Europeia avalia cada caso. Atualmente, estão isentos da medida Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça.
Além disso, é possível reduzir o número de certificados CBAM comprados pelos importadores europeus – na fase regular – se for comprovado que o pagamento pelo carbono do produto já foi feito no país de origem. Também há possibilidade de isenção específica do setor de eletricidade, que tem dinâmica diferente do tratamento dos outros produtos.
9. Como os países parceiros receberam a nova medida?
A medida europeia tem sido questionada pelo Brasil e por outras nações exportadoras dos produtos afetados, em fóruns internacionais, devido às incompatibilidades do regulamento em relação às normas internacionais do comércio. A alegação é de que o CBAM contraria os princípios de não discriminação do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio (GATT), já que a medida dá um tratamento diferenciado para os territórios, principalmente entre os Estados-Membros da UE e os países de fora do grupo.
Além disso, é apontada uma violação ao princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, previsto na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC, em inglês United Nations Framework Convention on Climate Change). O acordo determina que as nações terão atribuições diferentes no combate às mudanças climáticas de acordo com suas condições individuais.
10. O que a mudança significa para os exportadores brasileiros?
Os novos desafios afetam os exportadores brasileiros principalmente porque haverá aumento dos custos de transação para que se adequem às exigências do regulamento e possam continuar exportando para a UE.
11. O que os exportadores do Brasil precisam fazer para continuar vendendo para o UE?
Os importadores da UE sofrerão os principais impactos do regulamento, mas a medida afetará todos os envolvidos na cadeia produtiva. Por isso é fundamental que os exportadores brasileiros auxiliem os parceiros comerciais, por meio de canais de comunicação efetivos, para que consigam cumprir a medida e para que seja garantida a competividade do produto brasileiro no bloco europeu. O descumprimento do mecanismo prevê multa e, consequentemente, pode restringir o acesso de produtos brasileiros no mercado da UE.
Considerando que o prazo para o primeiro relatório trimestral com dados das emissões é 29 de fevereiro, é essencial que os exportadores brasileiros enviem essas informações aos parceiros europeus o quanto antes.
A Comissão Europeia oferece um guia de apoio para operadores fora da UE sobre plantas sujeitas ao CBAM e um modelo sugerido de troca de informações entre importadores europeus e operadores de plantas.
12. Qual o impacto do CBAM nas exportações brasileiras?
Produtores e exportadores brasileiros poderão ver usuais fluxos de comércio desviados a partir do aumento de custos e riscos associados à sua produção. De acordo com uma estimativa elaborada pela CNI, o CBAM impactaria mais de US$ 3 bilhões das exportações brasileiras para a UE dos produtos no escopo do regulamento, em 2023.
Dos produtos do CBAM exportados pelo Brasil ao bloco europeu, cerca de 20% foram para a Bélgica e 13% para a Itália, seguidos por Espanha, Portugal, França e Alemanha. Praticamente todas as exportações brasileiras desses produtos à UE foram concentradas no setor de ferro e aço.
13. O assunto tem sido discutido no Brasil?
O novo regulamento da União Europeia tem recebido a atenção do governo brasileiro, da indústria e da sociedade civil. Além de articulações internas, autoridades governamentais e representantes de instituições já se reuniram em diálogo sobre o CBAM e seus impactos.